Mesmo com condições de compra mais difíceis para os empreendimentos de médio e alto padrão e com as atualizações do Minha Casa, Minha Vida (MCMV) ainda em curso no segundo trimestre, o período de abril a junho foi melhor do que o esperado para as incorporadoras listadas em bolsa, de acordo com as prévias operacionais divulgadas nas últimas semanas. Isso já tem sido reconhecido pelo mercado.
O segmento para baixa renda foi mais uma vez o destaque do período, com companhias ampliando lançamentos e vendas. Mesmo quem reduziu lançamentos, caso da MRV&Co, apresentou alta de 48% nas vendas líquidas na comparação com o segundo trimestre do ano passado, levando em conta apenas a sua atividade de incorporação nacional, que atende o MCMV e a faixa logo acima do programa.
A Direcional apresentou o maior valor geral de venda (VGV) de lançamentos da sua história. Cury e Plano&Plano tiveram os melhores trimestres de suas histórias em vendas.
As altas vieram acompanhadas de aumento no valor cobrado pelos projetos e de uma estabilização dos custos de construção, o que pode se refletir em resultados financeiros melhores.
Bruno Mendonça, analista de mercado imobiliário do Bradesco BBI, afirma que o bom desempenho das incorporadoras econômicas é também sintoma da falta de competição nesse mercado. “Quem estava fora ainda não teve tempo para voltar”, diz.
Como explica Rafael Quick, analista do Banco Inter, muitas empresas não conseguiam mais operar no programa, em um cenário recessivo, o que deixou espaço para que os negócios mais robustos crescessem.
Há uma janela de oportunidade para que as grandes sigam ganhando mercado e elevando o preço de venda. O novo teto do MCMV, que passou de no máximo R$ 264 mil para R$ 350 mil, facilita essa alta, o que deixa o mercado ainda mais otimista. “Se já está bom assim agora, a tendência é melhorar nos próximos trimestres”, diz Mendonça.
Está claro para os analistas que, diante de um cenário tão positivo, não vai demorar até que mais concorrentes apareçam.
Esse movimento já começou. Lavvi e Trisul, incorporadoras que atuam no médio e alto padrão, já anunciaram possuir banco de terrenos para entrar no MCMV. A Lavvi, que lançou um empreendimento de luxo no segundo trimestre com a grife Elie Saab, anunciou no fim de junho a criação da marca Novvo para atuar no programa habitacional.
Há empresas que operam na baixa renda, ainda que não seja o principal negócio, como a Cyrela, com a marca Vivaz.
“A pergunta é se em algum momento vai ter exagero, porque vai ter gente demais vindo para o segmento”, afirma Mendonça.
Aprendizado
A década passada ensinou para muitas empresas que não é tão simples operar no econômico, que tem margens mais baixas e exige operação muito eficiente. “Os aventureiros não têm histórico muito bom”, diz o analista.
Ele lembra que, além do MCMV, há programas regionais relevantes, como o paulistano Pode Entrar, que vai contratar 40 mil residências, atraindo mais negócios para o setor.
“O segmento de baixa renda tem barreira de entrada menor, o FGTS tem recursos e o programa tem demanda”, diz Quick. “As empresas estão tentando abocanhar parte do mercado”.
Na média e alta renda, houve quem segue a estratégia de focar em venda de estoque e não lançar, como Helbor, Gafisa e Melnick. Enquanto isso, a Cyrela surpreendeu com alta de 51,6% nos projetos novos. Nos dois cenários, as vendas seguiram, ainda que de forma mais tímida para quem não lançou.
Para Mendonça, o trimestre trouxe “melhora de perspectiva” para as companhias de média e alta renda. Mesmo as entregas, que acenderam alerta para o risco de elevação nos distratos, dado o aumento da taxa de juros nos últimos anos, estão ocorrendo “de forma suave”.
A expectativa de queda de juros anima especialmente quem investe e constrói para média e alta renda, o que, somado aos resultados operacionais positivos, aumenta a confiança no setor. “No fim do ano passado, tinha o medo de que o mercado poderia piorar muito, agora essa discussão é de quanto será a melhora”, afirma Mendonça.
Para Quick, o setor como um todo tem visto valorização das ações e mais otimismo, mas daqui para a frente é a hora de bater mais nos fundamentos dos negócios. “A partir de agora, começamos a reacessar essas informações para ver quem sai ganhando, para continuar precificando esses”, concorda Gabriela Joubert, analista-chefe do Inter.
Mendonça considera que o setor está “morno”, e que não há motivo para muito otimismo nem pessimismo. “Às vezes, esse mercado é melhor para os players grandes, porque quando tem ‘oba, oba’, quando todos estão otimistas, é a hora que o pessoal faz bobagem”, diz.
Fonte: Valor Econômico.